sexta-feira, novembro 19, 2004

MINHA GERAÇÃO

Eu nasci... há 21 anos atrás. Eu nasci há 21 anos atrás, em 1983. Sou o último produto de longo e breve século, segundo historiadores. Apesar de ter uma aparência externa jovem, eu e meus contemporâneos somos museus ambulantes. Durante nossos primeiros meses de vida, o país estava em turbulência, na passagem da Ditadura para a Democracia. Nascemos em meio a esse limbo. Crescemos enquanto o mundo se transformava a nosso redor. Não essas transformações bestas, locais e que efeito de médio prazo que acontecem todo santo dia. Falo de acontecimentos históricos, simultâneos, que mudaram a vida de tudo e todos para sempre. Sempre: o fim da Ditadura, a redemocratização do país, o alastramento e combate a aids, 11 de setembro, a queda do muro de Berlim e o surgimento dos computadores caseiros e a internet. Esses foram os principais em termos gerais. Também há diversos outros eventos revolucionários que ocorreram nesses conturbados 21 anos. "Os Simpsons", para mim e muitos outros, foi um acontecimento revolucionário na cultura pop. Nirvana e Legião Urbana, músicas de acampamento, são do final dos 80 e início dos 90. Nós testemunhamos o mundo e os costumes mudaram enquanto começávamos nossa vida escolar. Para o vestibular, tivemos de estudar fatos que acompanhamos na infância. Certo que toda geração tem um fato de grande importância, mas nós tivemos vários! Quando envelhecermos, talvez nos tornemos cópias do Vovô Simpson, contando histórias de uma época tão distante que parece fora da realidade. Nós seremos ficcção. Um sentimento, aliás, que acompanha essa geração. Apesar de sermos de carne e ossso, nos sentimos como ficção. Nossa existência é fantástica e insignificativa demais para ser verdadeira. Como disse, tudo aconteceu quase que ao mesmo tempo nos últimos anos. O tempo passa frenético. oferecendo oportunidades e arrancando- as de nós numa fração de segundos. Temos muitas opções, o que nos obriga a sentir mal por não escolher ou escolher mal. Precisamos tomar uma posição em relação a tudo o que está ocorrendo no mundo, seja optar pela ignorância ou uma atitude mais drástica. Drogas não funcionam mais, o sentimento de culpa nos perseguirá agora sempre, independente de querermos fugir do mal- estar ou não. O mal- estar de de estar vivo num mundo abertlo e incompreensível vai acompanhar essa geração sempre. O modo utilizado para isso é nossa posição histórica. Enquanto outras gerações poderiam recorrer a Freud, ou outra explicação barata, para justificar sua depressão, acredito que o problema que aflige a geração de 83 é mais grave. No caso, o que nos atinge no peito é nosso posicionamento histórico. Em "O mal- estar da civilização", Freud tenta demonstrar o que seria a depressão e suas conseqüências. Fazendo um retrato detalhado, mas, ao mesmo tempo, atualmente vago, relata que a insatisfação humana viria da necessida não- preenchida de ser pleno. Caso tomemos essa idéia básica como verdadeira, veremos que nossa geração tem muita razão em estar desorientada. Como podemos ser plenos, em meio a uma chuva de acontecimentos e oportunidades? O filósofo bigodudo que deveria ter dificuldade em tomar sopa disse que Deus está morto. Seja morto, ausente ou fazendo vista grossa, o fato é que, em meio ao caos que tomou conta do mundo e das relações pessoais, surgem oportunidades para se destacar de diversas maneiras. Como não podemos aproveitar todas como gostaríamos, a agonia antecipada surge. Não ocorre a espera para reflexão e posterior depressão. Isso já ocorre antes, durante e após a escolha. Talvez isso venha devido a o fato de que nascemos em meio a um vazio histótico. Desde o nascimento, viemos programados para olhar para as opções e não saber qual adotar confiantemente. Apesar de nossas boas intenções, simplesmente não sabemos como se escolhemos certo ou não. E levamos nossas escolhas muito a sério, pois, devido a termos vivido em meio a acontecimentos históricos significativos, temos a idéia de que nossas escolhas não só refletirão em nós como em todos os outros. Estamos perdidos numa floresta sem direções, somos ondas batendo na areia, sem saber por que ou tentando evitar. Metáforas a parte, toda essa intensidade parece demais para ser verdadeira. E essa sensação de que nada é real de fato nos permite entrar no conformismo, dando- nos uma resposta para a história que cobra um posicionamento de nossa parte. "Isso não pode ser real. Logo, porque devo devo me importar?" Ou assustar as pessoas de tal forma que elas se conformem ou não consigam enxergar propriamente qual atitude tomar. "Se eu mudar de opinião, de repente, amanhã eu possa certo ou errado. Para que arriscar?" Toda essa gama de oportunidades nos inibe e impede a ousadia. A idéia de que a história nos julgará amedronta a todos. Especialmente uma geração que viveu na história enquanto acontecia. Nesse sentido, estamos condenados. Mas, ao mesmo tempo, nos dá esperança. Nascer num limbo histórico deixa nossas opções abertas. Podemos não ter certeza de que estamos fazendo a coisa certa, mas podemos optar entre várias possibilidades. O fato da realidade estar mais interpretativa do que nunca nos últimos anos é o sinal. Apesar da ausência de uma base, é mais fácil conquistar algo na confusão do que numa mentalidade estabelecida e inquestionável. Ao mesmo tempo que a geração de 83 está condenada a nunca saber quais serão os efeitos de seus passos ( e não conseguir pensar a longo prazo ), isso pode ser sua redenção. Sua ignorância em relação aos fatos, juntamente com sua agonia por estar num limbo histórico e moral, pode causar mudanças revolucionárias, como as que se acostumaram a ver enquanto cresciam. Acredito que o grande dilema de minha geração é esse: não saber se estão lutando pela salvação ou pela perdição.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Eu sou de 82, mas compartilho desses mesmos questionamentos. Nossa geração é bem indefinida mesmo, nascemos em um momento de transição, e estivemos muito proximos de grandes acontecimentos. Tenho a impressão de que tudo já foi feito e tentado antes de mim. Somos uma geração que já viu de tudo, que está com os olhos cansandos de já ter visto de tudo, temos uma certa insensibilidade natural, nada é novidade, todas as histórias já nos foram contadas... acho que sublimar esse paradigma é minha maior angústia.

-Pedro Fahel-

11:57 AM  

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