quinta-feira, janeiro 06, 2005

À BEIRA DO INFERNO DO CONFORMISMO ARTÍSTICO

Como a pessoa metida a intelectual que sou, tento me manter atualizado quanto às mais recentes manifestações artísticas. Claro que não atinjo meu objetivo como gostaria, mas faço o que posso e o que faço já tá de bom de tamanho. Espero! Enfim, de uns tempos para cá, tenho me questionado bastante sobre como a cultura está sendo encarada. Especialmente pelos jovens, que são, ou deveriam ser, aqueles que trazem algo de novo, que ousam e que procuraram refletir sobre a cultura vigente e a do passado e sua relevância no momento. Pelo o que pude observar, teoricamente, essa definição ainda é verdadeira. Há vários eventos de cultura "jovem" e "cabeça" pela cidade, mesmo que, devido à péssima divulgação da maioria desses eventos, nem todos tomem conhecimento. Entretanto, existem dois ditados velhos feito minha falecida avó e atuais como nascimente e morte: "quantidade não é sinônimo de qualidade" e "de boas intenções, o inferno estão cheio". Assim, na minha opinião, o cenário cultural está à beira da danação eterna. Cada vez mais, jovens artistas estão surgindo e promovendo suas manifestações. Isso seria ótimo, se não alguns detalhes importantes não estivessem sendo esquecidos: qual é a função dessa cultura nova que está sendo feita? Quem são os artistas de hoje? Qual é a proposta real? As perguntas que me faço são as seguintes: Estamos fazendo cultura ( uma manifestação relevante e que desafia os receptadores, que faz pensar sobre o que emitido ) ou "arte" ( A grande arte, inacessível para os receptores por sua natureza, tão superior, tão suprema, que sua simples existência é o motivo de sua importância. )? As novas manifestações artísticas são reciclagens mal- feitas ou apologias disfarçadas ao ego de seu criador ou ambos? Há uma preocupação em discutir a contemporaniedade e buscas novas formas ou apenas em agradar meia dúzia de "cabeças falantes" ( os intelectuais à la "Seinfeld", que falam, falam e não dizem nada )? A quem a cultura deve falar: às "cabeças falantes", a Bárbara Heliodora ou ao público? Eu poderia até entrar na velha discussão sobre se a razão está com a crítica ou com o público, mas não é o enfoque aqui. As perguntas que me faço surgiram após ter experiências literárias com autores do início desse século. Praticamente nenhum deles inovou ou mesmo procurou experimentar. Isso já era ruim. O pior é que esse conformismo artístico já está sendo defendido tanto de maneira consciente quanto inconsciente. Há desde autores que lançam trabalhos bons, mas que podem ser encaixados como "mais do mesmo"; àqueles que acham que estão inovando quando apenas repetindo formas consagradas. Nunca tiveram tantos filhotes de Charles Bukowsky e Waly Salomão, na literatura, como no presente momento. No teatro, o fato das peças em cartaz serem de autores "clássicos" ou de contemporâneos que não se distinguem um dos outros, é a prova de que o conformismo não está restrito à literatura. Ainda no teatro, a velha idéia de peça popular, como apenas distração, e de peça intelectual, como algo para chocar pelo prazer de chocar, ainda é vigente. O cinema vai pela mesma linha. Isso já funciona como um baita inibidor para os receptores procurarem algo "fora da rotina". O problema é que também barra o surgimento de novas vozes. O que é curioso ver é que, aqueles que se repetem, se vêem como inovadores. Acreditam tanto nisso que fecham os olhos para outros tipos de manifestações. Acham que sua definição está correta a tal ponto que, o que eles julgam inferior, é descartado. Dizer que a cultura, ao invés de disponibilizada, está sendo manipulada por grupos, não é nenhum absurdo. A verdadeira definição de arte é , a meu ver, o que aqui chamo de cultura: procurar desafiar seu receptor. O que estou vendo é "arte": exibições de pseudo- intelectualidade, cuja proposta real é fazer seu receptor engolir tudo goela abaixo, sem demonstrar qualquer oposição, como crianças tomando um remédio de gosto ruim forçados pela mãe. A verdadeira cultura deve provocar oposição. Deve chocar, mas não pelo choque. O sentido da manifestação, por mais estranho que pareça aos olhos do receptor, deve fazer algum sentido, ter uma proposta coerente consigo mesma. Voltando à metáfora do medicamento, deve ser um remédio que as crianças nem perceberam que tomaram. Vamos tomar vergonha na cara! Vamos botar o ego pendurado no armário um pouquinho e olhar para os trabalhos, tanto emissores quanto receptores. Vamos verificar se nossas obras têm realmente uma razão para existir e não ser aceitar qualquer coisa que assistimos sem pensar bastante sobre ela. Tá na hora de percebermos que "cabeça" não significa "dar cabeçada". Há muita hipocrisia e pouca honestidade. A figura romântica do artista está tão corrompida que os autores "mais do mesmo" se transformaram em mártires. Pensando melhor, essa discussão também é tão velha quanto os ditados que citei acima! Entretanto, independente da idade, acho que é a mais importante e a menos discutida de todas. Resumindo: afinal, o que é arte?

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Os artistas contemporâneos sabem muito bem explicar as suas obras. Mas em realizá-las eles já não são tã bons

2:04 AM  
Blogger Jubsky said...

É isso aí Daniel. A gente costuma pensar que pode sentar uma tarde e produzir algo encantadoramente inovador. E aí o que acontece é que produzimos - e consumimos - nada além de "mais do mesmo". Eu estou disposta a aceitar o desafio. O desafio de abrir novos caminhos na selva que permitam-nos escapar do círculo no qual estamos presos. E não espero menos nem de vc e nem do Faustini...
Ou estou errada? Para que podemos sonhar com um Feliz 2050, talvez.
Equanto isso, Feliz 2005 para ti.

7:12 PM  

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